(Material complementar à Coleção Mobiliza – fascículo 1)
Abraço Cultural aposta em causas emergentes e inovação na prática
O Abraço Cultural, associação criada em 2015, é um projeto pioneiro no Brasil, que tem se tornado a porta de entrada para muitos refugiados no mercado de trabalho. A ideia de fundar a organização surgiu em 2014, quando a plataforma social ‘Atados’ realizou a 1ª Copa do Mundo dos Refugiados. Naquele momento, o grupo percebeu que era preciso criar um projeto mais duradouro, capaz de contribuir na missão de integrar de fato os imigrantes na sociedade. Surgia assim Abraço Cultural, com o objetivo de promover a troca de experiências, a geração de renda e a valorização dos refugiados.
“Na época, não se falava muito sobre refúgio. O assunto entrou mais na pauta em 2015, quando teve um estouro na mídia de uma matéria a respeito de um garoto refugiado que morreu na praia. Só que no Brasil já tínhamos bastante refugiados, principalmente filhos. Percebemos que a maior dificuldade deles era a integração no mercado de trabalho, pois não falavam a língua, existe a burocracia para validar o diploma, além do preconceito do empregador, de saber se ele é regulamentado ou não. Ao mesmo tempo, tinha um potencial enorme. Alguns falavam três ou quatro línguas”, relembra Mariângela Garbelini, coordenadora geral do Abraço Cultural.
E completa: “Percebemos assim que era preciso dar uma outra visão para esse público, ir além da doação. Claro que é importante esse acolhimento primário, mas pensar, de fato, como eles podem contribuir com a sociedade, encarar que também trazem benefícios para todos. Decidimos então potencializar a língua e a cultura, oferecendo cursos de idiomas, ministrados por refugiados. A ideia é transmitir muito mais do que o aprendizado de uma nova língua: queremos quebrar preconceitos e barreiras culturais, aproximando diferentes povos em um único lugar”, aponta a coordenadora.
Em 2015 o projeto começou a ser desenhado e o Abraço lançou a primeira turma piloto, com 15 vagas. Para a surpresa da equipe, mais de 500 pessoas se inscreveram para participar do curso. Foram então capacitados dez refugiados e eles iniciaram as turmas. São oferecidos cursos em quatro idiomas: inglês, francês, árabe e espanhol.
Os candidatos a professores recebem uma formação do Abraço, que contempla metodologia, didática, como se comportar numa entrevista e fazer currículo. Cerca de 70 refugiados já foram capacitados em São Paulo e no Rio de Janeiro. Hoje, a organização conta com 15 professores e está capacitando mais 20. Todo o material pedagógico é desenvolvido pela equipe, juntamente com os professores.
Na visão da equipe, um dos principais diferenciais do Abraço é justamente o protagonismo dos refugiados. Muitos dos professores hoje trabalham em outras escolas ou se tornaram empreendedores, criando seus próprios negócios.
Captação de recursos
Mariângela destaca que o Abraço nasceu como uma associação, mas tem uma perspectiva de negócio social, pois foi pensado para ser autossustentável. Com a venda dos cursos, a organização consegue cobrir todos os gastos com pagamento da equipe – são seis funcionários – e professores. Tudo é reinvestido na entidade.
A divulgação dos cursos acontece basicamente pelas mídias sociais, mas, atualmente, são os próprios alunos os grandes disseminadores dos cursos, o que faz com que novos estudantes cheguem a cada dia. Desde o início, já se passaram mais de 1500 alunos em São Paulo e no Rio de Janeiro.
O Abraço já contou com alguns apoios financeiros, como da Fundação Arymax, para investir na formação dos professores e, agora, acaba de ser selecionado em um edital da Brazil Foundation para aprimorar o material pedagógico e poder multiplicar a metodologia, visando disseminá-la em outras cidades. A associação já conta com dois voluntários na França e na Espanha que querem levar o projeto para lá. A participação de voluntários é justamente outro ponto fundamental, aponta a equipe. Atualmente, são 30 voluntários ativos, principalmente na área de comunicação, mas já passaram mais de 100.
Segundo Mariana, tem sido um desafio diário manter a organização, pois não há ninguém na equipe focado em captação de recursos. “Temos parcerias pontuais com outras organizações, mas precisam ser ampliadas. Acredito que as organizações sociais ainda trabalham em bolhas. Precisamos mudar isso. O trabalho em rede é extremamente importante. Acredito que, se a gente se unisse, o impacto seria muito maior”, reflete.
Projetos futuros
Agora, a equipe está participando de outros editais com o intuito de levantar recursos para levar a proposta dos cursos de idiomas com os refugiados para escolas públicas. Entre as novidades está também a Abracinho, um curso de idiomas voltado para crianças de oito a doze anos de idade, com foco em um processo de aprendizagem comunicativo cultural, que explora as relações da língua e cultura de professores refugiados.
A expectativa, de acordo com a coordenadora, é que o Abraço possa influenciar mais nessa temática no país, atuando também com advocacy, e fomentando uma rede de organizações que trabalhem a causa.
“O projeto é pioneiro e está inspirando outras iniciativas similares. Isso é ótimo. As pessoas creditam muito no nosso projeto, pois existe uma troca de culturas muito grande. Os alunos e professores criam de fato vínculos”, comenta Mariana.
Conheça mais:www.abracocultural.com.br