Ética na captação de recursos: não é detalhe, é DNA

A ética na captação de recursos é a base sobre a qual se constrói confiança, credibilidade e impacto real no terceiro setor.

Há 25 anos, um grupo de profissionais decidiu fazer história ao fundar a ABCR – Associação Brasileira de Captadores de Recursos. E eu também estava lá. Inspirados pelo movimento de profissionalização do terceiro setor no Brasil e no mundo, entendemos que, se quiséssemos respeito, impacto e sustentabilidade, precisaríamos começar pela base: valores claros, conduta profissional e compromisso público.

Assim nasceu a ABCR e, com ela, o nosso Código de Ética, disponível neste link.

Essa não foi uma decisão simbólica. Foi uma escolha estratégica, inspirada em exemplos como o da Association of Fundraising Professionals (AFP), nos Estados Unidos. A ideia era simples mas poderosa: quem capta recursos carrega o nome, a missão e a esperança de uma organização. E isso exige responsabilidade em cada passo.

Era mais do que um manual de conduta. Era, e continua sendo, um compromisso com a missão social.

Ética na captação: uma construção coletiva

Muita gente ainda acredita que a responsabilidade ética é apenas do captador de recursos. Mas não é bem assim.

A ética na captação depende de todo o ecossistema: profissionais, organizações, voluntários, parceiros, financiadores e até do público que se beneficia dos projetos.

Onde está a ética na prática da captação?

Listamos a seguir os principais pontos em que a ética se manifesta no dia a dia de quem atua com captação de recursos com propósito:

  • Compromisso com a causa: é fundamental ter uma identidade real com a missão e conhecer profundamente os projetos que representa.
  • Conduta profissional: abordar, pedir, negociar, prestar contas, tudo com seriedade e respeito. Pontualidade é ética. Escutar é ética. Palavra dada é palavra cumprida. Cada interação, do primeiro contato ao relatório final, constrói nossa credibilidade.
  • Escolha das parcerias: não basta captar. É necessário alinhar valores. Nem todo convite é uma boa ideia. Saber dizer “não” também é uma atitude ética.
  • Relações humanas: a ética se manifesta também na forma como nos relacionamos com equipe, voluntários, parceiros e outras organizações. Colaboração deve vir antes da competição.
  • Uso responsável dos recursos: captar é essencial. Aplicar corretamente os recursos é ainda mais importante.
  • Geração de renda com propósito: negócios sociais são bem-vindos, desde que a missão esteja sempre em primeiro lugar.
  • Transparência nos resultados: mostrar resultados é uma obrigação ética. Tanto as doações quanto os recursos públicos exigem transparência, metas claras e impactos demonstráveis.

Celebrar a ética é reforçar um compromisso

Comemorar os 25 anos da ABCR é lembrar que a ética nunca foi tendência passageira. Ela é, e sempre será, a nossa bússola.

Captação de recursos é, antes de tudo, um ato de fé. Acreditamos que é possível transformar o mundo, uma doação de cada vez. E a ética é o que garante que essa transformação aconteça da forma mais justa e coerente possível.

Para concluir, deixo um verso de Carlos Drummond de Andrade que, para mim, carrega o espírito da captação ética:

“O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.” (Mãos Dadas)

Que a liberdade de captar continue sendo um compromisso coletivo com a responsabilidade social. E que venham muitos outros anos com parceria, criatividade e ética no coração.


Autoria:
Carla da Nóbrega é consultora, fundadora da ABCR e integrante do comitê gestor do Instituto Museu da Pessoa e do Movimento por Uma Cultura de Doação.